sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Segurança jurídica e contratos de telemática (telefonia, computadores e internet): a insuportável fragilidade brasileira


             Com certeza absoluta você, que vai ler este texto - mais um grito sobre a realidade brasileira, tem um contrato de telefonia com uma das empresas que adquiriram o direito de explorar os serviços telefônicos no Brasil. E com certeza você não está satisfeito com o atendimento das empresas de telefonia, uso de computadores e de internet que operam em nosso país. E este é um precioso nicho de mercado: as empresas de serviços de telemática têm à sua disposição cerca de 220 milhões de consumidores, ou seja, uma das maiores clientelas do mundo, maior até do que o próprio conjunto da população brasileira. O surto da posse de telefones celulares faz com que milhares de consumidores tenham dois ou mais equipamentos em seu poder, e sem levarmos em consideração outras máquinas como computadores e televisores.

           Chega a ser vergonhoso o tratamento que estas empresas bilionárias - em dólares, dão aos usuários brasileiros. Donas de um mercado cativo, um verdadeiro oligopsônio, estas complexas organizações empresariais tratam sua clientela como se delas não dependessem para auferir os lucros estratosféricos que realizam, contrariando o princípio que dá sustentação às atividades constituídas por transações comerciais: tratar a clientela com o respeito que ela merece, no mínimo assegurando-lhe o cumprimento da segurança jurídica exigido por qualquer contrato, segundo o modelo positivista “garantista” inserido nas constituições de todo país que admite a existência da finalidade mercadológica.

A minha experiência com os serviços de telefonia, de televisão e de internet oferecidos pelas grandes empresas que adquiriram do Estado brasileiro o direito de explorar este tipo de comércio contratado, é das mais mal sucedidas.

               Antes da chegada das referidas empresas de telefonia, televisão e internet o Estado nacional criou empresas estatais que seguiam as orientações de uma estatal federal que centralizava e se responsabilizava pela gerência dos serviços oferecidos pelo desenvolvimento da teleinformática. Nós, brasileiros, éramos muito bem tratados e não nos dávamos conta desse importante detalhe comercial, do respeito pelo contrato de um imenso negócio que se desdobra em milhões de pequenos contratos, mas todos com o mesmo significado de fundo: o da garantia jurídica.

                  A segurança jurídica do contrato de telefonia assinado pelos cidadãos com empresas estatais brasileiras era respeitada ao extremo, e qualquer crítica ou queixa encaminhada pelos assinantes era devidamente levada em consideração pelos gerentes de cada área de serviço e pelos dirigentes maiores daquelas organizações complexas. Hoje, ela é fragilizada pelo desempenho das empresas particulares de telemática.

                   Hoje, nas mãos de empresas estrangeiras, e com certeza gerenciadas com a ajuda de brasileiros-modelo da sociedade do desempenho, aquela que substituiu a antiga sociedade taylorista da disciplina, as empresas que oferecem serviços teleinformatizados só se preocupam com o faturamento ampliado dos pequenos contratos que visa justamente o aumento progressivo dos seus lucros empresariais.

                 E assim, na sociedade do desempenho, que oferece ao trabalhador o engodo da liberdade em troca do aumento da produtividade, somos totalmente dominados pelo verbo modal poder, em contraposição à sociedade da disciplina que preferia proibições e conjugava o verbo dever.

            Em defesa dos empregados nessa sociedade do desempenho, que optou por substituir o paradigma da racionalidade, dominante na anterior sociedade da disciplina, pelo incentivo ao paradigma da produtividade, é importante denunciar que os trabalhadores foram levados a acreditar que têm o poder e a liberdade para perseguirem no dia-a-dia a superação de suas metas de forma ilimitada, quando, na realidade, estão se tornando prisioneiros emocionais de um embutido e eficiente “sub-paradigma de autoexploração” em substituição a um ultrapassado “sub-paradigma de autodisciplina taylorista”, que termina por levá-los à exaustão e a crises de depressão, além de, mesmo sem o saber, violarem princípios contratuais firmados para a prestação dos serviços que devem oferecer às clientelas das empresas para as quais trabalham. Por outro lado, aos dirigentes empresariais não lhes pode ser dado o direito de desconhecerem a verdade da nova estratégia do capitalismo neoliberal, que criou a sociedade do desempenho em substituição à sociedade da razão disciplinada. Neste último sentido, dou a palavra ao vitorioso empresário Luciano Hang, dono da cadeia de lojas Havan, que afirma: “o setor empresarial tem que ter a coragem e a responsabilidade de não aceitar o errado como verdadeiro”.

                 E nessa trilha do desempenho a qualquer preço, desculpem pelo trocadilho infame, o senhor Carlos Slim, lá no distante México, vai estufando depósitos bancários á sombra dos péssimos serviços administrados por brasileiros ambiciosos e incompetentes, e seu pessoal subalterno liberado para se transformar em adoradores do semideus produtividade.

                    Experimente assinar um contrato para usar qualquer um dos serviços oferecidos pelas grandes empresas de telemática sediadas no Brasil. Você pode contratar o mais simples e mais barato, e nunca mais deixará de se ser importunado, todos os dias, e a qualquer hora, por intermináveis ligações das tais companhias lhe oferendo “combos vantajosos” a preços mais baratos do que aquele do seu primeiro contrato.

                  E a partir dessa assinatura sua vida vai virar um inferno.
                  Em primeiro lugar, porque você vai passar a receber boletos de cobrança que nunca expressarão o verdadeiro montante do “combo vantajoso” contratado, após uma conversa educada e bem humorada de pelo menos uma hora de duração. Depois do novo contrato ampliado, cujo valor será aumentado em apenas 25% do montante do seu primeiro contrato, ou seja, se você pagava 201,00(duzentos e um reais), com o “combo vantajoso” vai passar a pagar apenas 250,00 (duzentos e cinquenta reais)! É realmente vantajoso, desde que fosse cumprido pela telefônica.

                 Acontece que a minha experiência revelou-me que a empresa de teleinformática não vai cumprir o tal “combo vantajoso”. Como assim? Ora, meus incrédulos amigos, depois do primeiro mês, minha conta passou a ser cobrada no boleto mensal no valor de mais de 450,00 (quatrocentos e cinquenta reais)! E minha vida transformou-se num inferno de telefonemas para essa empresa de telefonia, telefonemas por ela respondidos com argumentos grosseiros e mal educados, como se eu os estivesse aborrecendo por não aceitar o descumprimento do contrato comigo assinado! Para essa gente, a culpa era minha, nunca deles, por mais que você explicasse onde estava o erro e quem era responsável pelo mesmo. E pasmem: mesmo depois de ir ao PROCON e registrar o caso, essa telefônica com a qual assinei um contrato de serviço que estava sendo flagrantemente desrespeitado, jamais aceitou a minha atitude, pois até me perguntaram se não queria desfazer a assinatura, e isso depois de terem sido notificados pelo órgão de fiscalização governamental!

                 Vocês devem estar pensando que tudo acabou por aqui. Pois vocês estão enganados, porque esta empresa de serviços de telemática perpetrou mais uma travessura contra este infeliz assinante: o tal “combo vantajoso” dividiu a conta em duas, uma de duzentos e treze reais e noventa e seis centavos e uma segunda no valor de trinta e quatro reais e noventa e nove centavos, perfazendo um total de cerca de duzentos e quarenta e oito reais e noventa e nove centavos.

               Tudo bem, todo mês, ao invés de uma, agora tenho duas contas para pagar. Mas você se queixa apenas disso? Ó incrédulos assinantes! Uma terceira travessura surgiu no horizonte: a companhia criou uma terceira conta e não me avisou! Os estúpidos criaram a cobrança de uma terceira obrigação, esta no valor de trinta reais: agora eles estavam cobrando o pagamento pela linha que eu estava utilizando, e não me avisaram! E pior: consideraram que eu não efetuei o pagamento por mais este serviço, que não me foi especificado quando da aceitação do tal “combo vantajoso”, e me impediram de continuar fazendo as chamadas telefônicas que eu sempre tenho que fazer diariamente, para meus familiares! E mesmo depois de pagar por mais uma conta, criada sem qualquer aviso, em total desrespeito a um contrato comercial, estes senhores não tomaram conhecimento de que eu já havia quitado mais esse débito para com a empresa! Fui forçado a telefonar para informar que já tinha efetuado o novo pagamento! Que diabo de empresa teleinformatizada é esta, que não dispõe de um sistema interligado entre todos os seus setores de serviços para saber que uma dívida já foi quitada e, portanto, eles têm a obrigação de refazer a ligação interrompida?

                  Em grande estilo de cinismo, quando cortam o teu direito ao serviço contratado, essa gente coloca um velado aviso surrealista: “Este telefone não está programado para receber esse tipo de ligação!” Ora, ora minha gente, eu fiz dois de três pagamentos, e não fiz o terceiro porque não fui avisado sobre a terceira conta! Em curtas palavras, isto se chama abuso econômico e desrespeito a um contrato comercial!

                  Uma pergunta que não quer calar: e a ANATEL, por onde anda? Ora, caros assinantes, a ANATEL é um amor de agência fiscalizadora, ela nada faz contra os abusos das empresas de telemática, e nada faz porque sabe que nada pode! A ANATEL deveria deixar de somente agir de modo “politicamente correto” em defesa dos empresários, e atuar defendendo corajosamente os interesses do povo brasileiro. O oligopsônio das empresas de telemática trabalha como bem entende, pois sabe, como o senhor Carlos Slim e seus dirigentes brasileiros, que o Brasil “es um desmadre”!

                   Sabem como estas empresas de telemática vão aprender a respeitar os contratos com seus assinantes? Quando alguém impetrar uma ação contra os abusos praticados contra os brasileiros, e um juiz, tipo Sérgio Moro, multar essas empresas em um milhão de reais por cada caso de abuso contratual e desrespeito aos assinantes brasileiros! Estamos carentes de uma legislação contra o abuso do poder econômico, e bastará apenas uma multa nesse montante milionário e estas empresas passarão a trabalhar como podem e devem: respeitando a clientela que lhes enche os cofres, pois nos cobram as mais altas tarifas telefônicas do mundo! Nos Estados Unidos é assim que agem os juízes contra grandes empresas incompetentes ou desonestas.

                    Por fim, ou o Congresso Nacional dá um jeito nessa forma estúpida de conduzir os negócios teleinformatizados em nosso país, impondo ao setor regras de funcionamento civilizado que enquadrem devidamente às empresas do ramo, ou continuaremos sendo maltratados e enganados por companhias que deveriam ter substituído as empresas estatais do setor com uma maior e melhor qualidade dos serviços que vieram oferecer ao já tão sofrido e abandonado povo brasileiro. E se o Congresso Nacional nada fizer contra tamanho abuso, teremos que reagir, nem que seja utilizando-nos das redes sociais e do poder dos celulares e dos computadores nesta sociedade brasileira do desempenho que apenas começa a dar seus primeiros passos.
           

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